terça-feira, 31 de julho de 2012

Sobre um SERVIÇO de Defesa do Consumidor

Sinal dos tempos: mudanças aceleradas na vida moderna, que bombardeiam até as comunidades indígenas (não mais tão isoladas), estão afetando aspectos cada vez mais inusitados da vida dos indivíduos. Tal fenômeno se torna tanto mais evidente quanto mais idoso se torna o ser humano na sociedade , dado o enfraquecimento paulatino de sua capacidade de defesa, tanto física quanto mental.

" Mais evidente" não significa, em algum momento da vida, inexistente, mas que seu nível, na consciência, difere nas diferentes faixas etárias. Em algumas fases da vida tais mudanças podem passar desapercebidas dado o tempo que decorre entre a introdução de um fator de mudança social e as suas consequencias.

Algumas pessoas se lembram (outras, mais jovens, só ficam sabendo) que antigamente, a vida nas comunidades era muito mais tranqüila. Não havia imposto de renda, taxas governamentais, cobrança obrigatória de serviços tais como o de entrega de mercadorias, enfim, nem médico se pagava, dada a sua raridade; as famílias apelavam às farmácias e respectivos farmacêuticos em casos de doenças e acidentes.

Hoje se paga por tudo, até pela água para beber. Como meu avô dizia, pelos idos de 1950, "vai chegar o dia em que se pagará até pelo ar que se respira". Tendo em vista o atual índice de poluição do ar, pergunte, por exemplo, aos japoneses, se isto já pode ser verdade!

Mas esta é apenas uma digressão para expor o por que do assunto sobre o qual pretendo falar.

Ele surgiu a partir de um fato trivial que ocorreu recentemente em meu dia a dia: a compra de um creme dental.

Sempre me utilizei - com raras ocasiões em que experimentei produtos que a mídia tentou me impingir - da mesma marca de dentifrício. Ultimamente comprei um tubo (dos grandes e, por sinal, bem caro) de meu creme dental costumeiro numa certa drogaria. Para minha surpresa espremi, espremi ...e, nada!

Após espremer o tubo até a metade é que começou a sair o creme. Ora, paguei o dobro do preço pelo creme dental, pois o fiz também pelo ar nele contido.

Ganância pura do fabricante ou serviço de embalagem de má qualidade, ou, ainda, algo poderia ter ocorrido no percurso entre a industrialização e a comercialização do produto até chegar ao consumidor - infelizmente eu.

Este fato, embora trivial, me deixou "furiosa", não tanto pelo fato em si, mas pelo conteúdo ético e moral nele contido: o desrespeito do fabricante ou do fornecedor ao consumidor - ser humano que, em última instância , é seu irmão na espécie e a própria razão de seu trabalho. Desde quando um consumidor precisaria se defender do fabricante ou do fornecedor de um produto, quando, ao contrário, a sua utilização é que deveria ser protegida uma vez que, assim, o fabricante e o fornecedor estariam defendendo seus próprios interesses econômicos ?

Lógico! Também tenho elogios a fazer ao fabricante pois o creme dental é ótimo. Basta dizer que até hoje ( percorrendo meus 89 anos - mas não conte a ninguém!), com exceção dos dentes do "sizo" nunca precisei extrair um dente.

Entretanto, este é apenas um exemplo do que ocorre diariamente em milhares de casos na vida dos indivíduos na sociedade moderna. O que importou realmente na situação, foi a minha inércia - eu nada fiz. Eu aceitei um fato que me prejudicou material e moralmente e o justifiquei , primeiro, porque eu poderia economicamente fazer frente a ele e, depois, porque dentro dos costumes sociais casos muito mais graves do que o meu ocorrem constantemente ao meu redor.

Cada vez mais o homem se sente, na sociedade, em uma arena , cercado de inimigos que se escondem por trás dos "sistemas", das " normas", das "regras", dos "costumes", das "leis", enfim, de uma parafernália administrativo -burocrática destinada a coagir o comportamento social do cidadão. Ao mesmo tempo, essa parafernália permite a auto- justificativa do sistema, a sua isenção das responsabilidades pelas conseqüências na medida em que permite aos seus autores se colocar na posição de "bonzinhos", dos "mocinhos", que ajudam "Associações Beneficentes ", "Correntes do Bem", "Ajuda Humanitária", etc., os quais não precisavam existir se cada indivíduo ajudasse seu vizinho e cada SERVIÇO social, o fosse, realmente, em prol do bem comum e não do lucro individual.

Todos concordam que as crianças precisam ser cuidadas e preparadas para viver (e se defender) em sociedade. Elas ainda não desenvolveram uma consciência social, crítica, nem auto- crítica.

Os jovens - donos do mundo - se apoderam alegremente ( às vezes violentamente) de tudo que a sociedade, na maioria dos casos, através da mídia, lhes oferece. São, usualmente, as vítimas preferenciais de ganância da política, da indústria e do comércio. Dificilmente o jovem permite a interferência do adulto (familiares, em geral ) que tenta alertá-los a respeito das armadilhas sociais - pois são os donos da verdade!

Além disso, os próprios adultos também são, em muitos aspectos, vítimas indefesas de armadilhas sociais, dada a complexidade burocrática das exigências que na vida moderna,sobre eles incidem. Eles não têm mais tempo nem forças para se defender dessas armadilhas e partem para a passividade, a inércia.


Finalmente chega a época da vida em que o adulto é afastado legalmente do trabalho produtivo e vai tentar sobreviver socialmente. O distanciamento da vida social economicamente ativa, a crescente dificuldade em acompanhar as mudanças, nem sempre positivas, dos fenômenos sociais, neles instalam, gradualmente, o cansaço, o descaso, o desprezo pela insignificância de tantas restrições e exigências perante o valor da vida humana. Tal processo leva o indivíduo, idoso, com o acúmulo das experiências de vida, a um distanciamento cada vez maior das coisas do mundo.

Então, é possível ver que uma crescente dominação sócio - econômica do indivíduo , a partir de sua chegada ao mundo, ocorre principalmente pelo fortalecimento gradual de um fator comum no comportamento humano: a omissão (fuga psicológica), que decorre da inércia provocada pelas barreiras impostas pelo sistema social à liberdade , à iniciativa individual e grupal, à auto-defesa.

Exemplos desta afirmação, encontramos em fatos tais como: ninguém quer se apresentar como testemunha de acontecimentos escabrosos; raramente alguém pára em uma rua a fim de socorrer um indivíduo desmaiado ( principalmente se estiver mal vestido); se duas pessoas brigam a socos e pontapés, os transeuntes passam ao largo por medo de que algum "tabefe perdido" possa alcançá-los, e assim por diante...

Na infância, a criança é estimulada pela mídia através dos sentidos - cores, paladar, sons - sob a forma de guloseimas, de brinquedos e de músicas . Os super- heróis (super -homem, homem-morcego) assim como os anti-heróis (Coringa), são exemplos de valores inculcados que podem se desenvolver em ações anti- sociais. Vejam os casos da violência cometida em um cinema por um adolescente mascarado de Coringa e o da morte de uma criança após o "vôo" da Mulher Gato de um telhado.

Entretanto, as crianças nascem apenas com necessidades de sobrevivência. Aprendem com os adultos - principalmente pais, familiares e amigos - a desenvolver necessidades e interesses em seu processo de socialização. São eles,em última análise, os responsáveis por tal processo pelo deslumbramento frente aos atrativos oferecidos às crianças pela mídia. Portanto são eles, em última análise, os responsáveis (porque são os que pagam) pelo surgimento de uma futura clientela destinada ao consumo do supérfluo .

Adolescentes e jovens que deveriam ter começado a aprender com os adultos a administrar suas necessidades, interesses e gastos, não encontrando nos pais os parâmetros de comportamento necessários, fazem cada vez mais exigências sem pensar nas consequências.

Pressionados, de um lado, por interesses e necessidades ( socialmente criadas) das crianças e adolescentes e, de outro, por hábitos e necessidades sociais inculcados quase subliminarmente, pela mídia e por exemplos de comportamentos sociais, os adultos são, ao mesmo tempo, vítimas e responsáveis pelo caos existente em muitos aspectos da sociedade atual.

Com a ajuda de medidas que podem decorrer de pesquisas e estudos sérios (e não apenas para determinar os vários e eternos sexos dos anjos), a população adulta seria o instrumento capaz de iniciar a introdução de mudanças em alguns aspectos sociais cruciais visando a melhoria de nossa vida atual.

No momento, como vimos, se torna quase impossível , ao consumidor, defender-se das armadilhas sociais , pois apesar da existência de um Código de Defesa do Consumidor, podemos dizer que ainda não há, na prática, um eficiente Serviço de Defesa do Consumidor.

Dado, por exemplo, o meu caso, tanta seria a burocracia a ser enfrentada que a solução final seria um resultado desastroso, isto é, bem pior do que o mal que desencadeou o processo.

O que fazer, então?

A medida mais lógica seria, portanto, Trazer ao consumidor os meios de ação e, não, colocá-los como " estrelas distantes" que ele , como um super-homem, deveria alcançar. Em outras palavras, é preciso " encurtar o caminho " entre o consumidor e a solução de seus problemas.

Se tal Serviço existisse, no caso de minha pasta de dentes eu necessitaria apenas de um telefonema e um funcionário ( um ser humano) viria ao meu encontro para conhecer detalhes, obter provas, estudar meios e partir para a ação. Eu estaria desobrigada de tarefas penosas e desgastantes, quando realizadas sozinha: tomar conduções, procurar repartições, preencher documentos escritos em linguagem jurídica e/ou técnica, contatar funcionários, quase sempre não os encarregados do caso os quais, por sua vez me encaminhariam a outros funcionários , etc.,etc. para, finalmente, conseguira resposta de que deveria aguardar por uma resposta sobre a solução do meu problema. Este "aguardar" se prolongaria por meses, anos, até um dia, talvez após minha morte, em que uma Autoridade Competente conseguisse produzir uma solução definitiva. Mas não mais existiria o problema, pois nem dentes mais eu teria!

Crianças, adultos e idosos, não precisam deste tipo de "proteção ". Os direitos da criança, do idoso , assim como do cidadão, deveriam ser a decorrência natural de ações baseadas na Justiça, no Bem, na Honestidade e- por que não? - na Inteligência e Boa Vontade de nossos dirigentes e seus funcionários. (Oh! Céus! Onde encontrar um candidato com tais qualidades para eu votar nele?)

Que saudade dos tempos antigos, quando a palavra tinha peso e o fio de barba valia mais que um contrato (com firma reconhecida!) Oh! Saudade! Geme o velho, a exemplo de minha mãe quando escreveu em seu livro de poemas:

" A Saudade no velho
é como a nuvem da tarde
ainda dourada do sol.

Será a Saudade
triste lembrança
ou suave esperança? "

E eu acrescento:

Talvez a falta
da parte d'alma
que no tempo ficou...













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